terça-feira, 12 de março de 2019

da abominação ao sagrado

"Não sou um cineasta da abjecção. Sou um cineasta da abominação. Há coisas que são abomináveis, e isso eu mostro. Faço filmes para mostrar isso. (...) Andamos aqui há anos, os filmes seguem-se uns aos outros e há uma lógica nisto tudo: é passar da abominação ao sagrado."
João César Monteiro

segunda-feira, 11 de março de 2019

abramos os olhos

Quando nada está acontecendo, há um milagre que não estamos vendo. 

Guimarães Rosa.

sábado, 9 de março de 2019

E por vezes

E por vezes as noites duram meses 
E por vezes os meses oceanos 
E por vezes os braços que apertamos 
nunca mais são os mesmos    E por vezes 

encontramos de nós em poucos meses 
o que a noite nos fez em muitos anos 
E por vezes fingimos que lembramos 
E por vezes lembramos que por vezes 

ao tomarmos o gosto aos oceanos 
só o sarro das noites      não dos meses 
lá no fundo dos copos encontramos 

E por vezes sorrimos ou choramos 
E por vezes por vezes ah por vezes 
num segundo se evolam tantos anos 

David Mourão-Ferreira, in 'Matura Idade' 

domingo, 7 de outubro de 2018

A Lula

Presidente, o Brasil vive um momento muito difícil. A ameaça do fascismo, quem diria, presente nas ruas e nas praças. No seu aniversário, além do desejo de muitos votos em Haddad 13 no dia de amanhã, desejo que possamos ter um futuro democrático, sem essa onda de violência e ódio descabida. Ao senhor, desejo diretamente a justiça. Sua liberdade. Sua saúde, sua paz.

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Autonomia

Autotomia
(WISLAWA SZYMBORSKA)

Diante do perigo, a holotúria se divide em duas:
deixando uma metade ser devorada pelo mundo,
salvando-se com a outra metade.

Ela se bifurca subitamente em naufrágio e salvação,
em resgate e promessa, no que foi e no que será.

No centro do seu corpo irrompe um precipício
de duas bordas que se tornam estranhas uma à outra.

Sobre uma das bordas, a morte, sobre outra, a vida.
Aqui o desespero, ali a coragem.

Se há balança, nenhum prato pesa mais que o outro.
Se há justiça, ei-la aqui.

Morrer apenas o estritamente necessário, sem ultrapassar a medida.
Renascer o tanto preciso a partir do resto que se preservou.

Nós também sabemos nos dividir, é verdade.
Mas apenas em corpo e sussurros partidos.
Em corpo e poesia.

Aqui a garganta, do outro lado, o riso,
leve, logo abafado.

Aqui o coração pesado, ali o Não Morrer Demais,
três pequenas palavras que são as três plumas de um voo.

O abismo não nos divide.
O abismo nos cerca.