sábado, 8 de junho de 2013

Crianças na rua principal

(...)

Um de nós começou a cantar uma cantiga de rua, mas todos nós queríamos cantar. Cantamos muito mais rápido do que o comboio corria, balançávamos os braços porque a voz não bastava, formamos com as nossas vozes uma confusão na qual nos sentíamos bem. Quando se mistura a própria voz com as outras fica-se preso como por um anzol.

Assim cantamos, a floresta às nossas costas, nos ouvidos dos longínquos viajantes. Na aldeia, os adultos ainda estavam acordados, as mães preparando as camas para a noite.

Já era hora. Beijei quem estava a meu lado, aos três próximos estendi as mãos, comecei a fazer o caminho de volta correndo, ninguém me chamou. No primeiro cruzamento, onde eles não podiam mais me ver, dobrei a esquina e corri outra vez pelas trilhas do campo para a floresta. Eu queria ir para a cidade do sul da qual se diz na nossa aldeia.

- Lá existem pessoas - imaginem! - que não dormem!
- E porque não?
- Porque não ficam cansadas.
- E porque não?
- Porque são loucas.
- Então os loucos não ficam cansados?
- Como é que os loucos poderiam ficar cansados?


Crianças na Rua Principal, Franz Kafka

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