sexta-feira, 19 de julho de 2013

Constatação do Absurdo

De um lado, a pobreza de um meio operário, a estreiteza de uma casa com cómodos, a rigidez de uma disciplina imposta para fazer render o suado pão de cada dia, as condições de sobrevivência restritas ao essencial. De outro lado, a exuberância de uma paisagem luminosa, a imensidão de um mar eternamente azul, vislumbrado desde a esquina de cada rua, explodindo sem cessar sobre as areias sem fim. Como um luxo supérfluo nesse esbanjamento de beleza, as ruínas romanas desafiam o tempo e parecem lembrar a mortalidade dos homens. A sua lembrança, entretanto, é igualmente supérflua: por falta de bens imprescindíveis, morre-se muito cedo - e morre-se jovem - nessa terra onde tudo convida a viver.

Nascido e criado entre contrastes fundamentais, Albert Camus desde cedo aprendeu que a miséria engendra uma solidão que lhe é típica, uma austeridade toda sua, uma desconfiança da vida - mas a paisagem desperta uma rica sensualidade, uma eufórica sensação de omnipotência, um orgulho desmedido de possuir a beleza inteiramente gratuita. Esse aprendizado, feito a meio caminho entre a miséria e o sol, levou-o à consciência do que existe de mais trágico na condição humana: o absurdo, essa irremediável incompatibilidade entre as aspirações e a realidade. 

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O absurdo consiste na incompatibilidade entre um anseio humano de explicação para o mundo e o mistério essencial desse mundo inexplicável, entre a consciência da morte e o desejo de uma impossível eternidade, entre o sonho da felicidade e a existência do sofrimento, entre o amor e a separação dos amantes.


em Vida e Obra de Albert Camus

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